Pontos Principais

  • O Brasil é altamente dependente do etanol para a garantia do abastecimento, sendo o etanol responsável por mais de 40% do abastecimento de combustível no país.
  • As decisões do governo sobre os preços da gasolina podem levar ao risco de escassez de combustível a longo prazo.
  • O fim da isenção de impostos federais pode ser positivo para preços de etanol – mesmo com uma redução no preço da gasolina.

Os veículos leves no Brasil só podem rodar com gasolina (com uma mistura de 27% de etanol) e/ou etanol hidratado. O uso de diesel foi proibido desde a década de 70, em decorrência da crise do petróleo. Por ser um país de proporções continentais e altamente dependente da movimentação de mercadorias por estradas, o governo da época precisava garantir a oferta de combustível para os caminhões.

O Brasil não mudou muito, ainda utilizamos as rodovias como principal meio de transporte de produtos de um lugar para o outro – cerca de 65% contra 15% das ferrovias.

Como resultado, a frota brasileira de veículos evoluiu principalmente para veículos a gasolina e etanol. Com a introdução da tecnologia de combustível flex (FFV) em 2003, a frota de carros passou a ser composta por mais de 80% de FFV.

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Fonte: Anfavea, Czapp

Ao olhar para o consumo de combustível no Brasil, portanto, focamos no que chamamos de “Ciclo Otto” (demanda de combustível do motor a combustão).

O consumo brasileiro de combustível ciclo Otto atingiu 54bi litros em 2022, o segundo maior já registrado. E desse total, 42% era etanol – incluindo o anidro para mistura à gasolina e o hidratado para FFV.

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Fonte: ANP, Czapp

O Brasil é altamente dependente do etanol para a garantia do abastecimento, e é por isso que mudanças nas políticas tributárias e nas políticas de preços da Petrobras podem criar incerteza quanto ao papel futuro do etanol e ao abastecimento a longo prazo.

Falta de combustível, não é uma opção

O Brasil tem uma capacidade limitada de refino de petróleo em gasolina, estimada em cerca de 31 bilhões de litros. Assim, a lacuna de demanda de combustível no Brasil (em torno de 25 bilhões de litros) precisa ser preenchida com etanol e importação de gasolina. A capacidade de produção de etanol do Brasil, nos anos em que o mercado incentiva os produtores a maximizar o açúcar e minimizar o etanol, está em torno de 30 bilhões de litros já incluindo o etanol de milho – mais sobre isso abaixo.

Até 2019, a Petrobras era responsável por mais de 95% da produção total de gasolina no Brasil. Então, em 2019, foi feito um acordo com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) no qual a Petrobras precisaria vender 50% de sua capacidade refino para acabar com o monopólio da empresa. Isso resultaria na venda de 8 de suas refinarias. Até agora conseguiu vender 2.

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Fonte: ANP, Czapp

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Com a mudança de Governo após as eleições presidenciais de 2022, a mentalidade em relação à venda das refinarias restantes é agora inversa. Rumores são de que o governo tentará fazer um acordo com o CADE para desfazer o compromisso firmado em 2019.

O resultado? Ou a Petrobras precisará aumentar a capacidade de refino (uma nova refinaria levaria pelo menos 4 anos para ser construída), a importação de gasolina precisará aumentar e/ou talvez o papel do etanol no abastecimento do país precise ser refletido no preço. Algo que com isenções fiscais e discussões de mudanças da atual Política de Preços Internacionais (PPI) fica difícil apostar nesta última como vencedora das opções.

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Assumindo uma média de crescimento de 4% na demanda de combustível, até 2025 as importações de gasolina precisariam ser de pelo menos 3 bilhões de litros. Não é o máximo que o Brasil já importou, mas o número pressupõe aumento da produção de etanol devido aos projetos de etanol de milho já previstos para serem implementados nos próximos anos – de acordo com a UNEM (União dos Produtores Nacionais de Etanol de Milho) em 2025 a produção deve crescer 30% para 6 bilhões de litros.

Outra suposição importante é que o consumidor continuará favorecendo o etanol. No entanto, como vimos com as mudanças na política tributária, uma paridade gasolina-etanol persistente acima de 70% impacta as preferências do consumidor, resultando em menor participação do etanol hidratado – menor preferência pelo etanol, mais gasolina necessária.

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Fonte: ANP, Czapp

Se a Petrobras desistir da PPI, a empresa voltará a importar com prejuízo, como ocorreu entre 2012 e 2015. Isso gerou um prejuízo estimado de mais de R$ 40 bilhões para a empresa. Difícil investir em refinaria quando há essa lacuna a preencher.

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Como dissemos, falta de combustível não é uma opção. O único player disposto a importar com prejuízo será uma empresa com 50% do governo. Outros se isentarão da obrigação.

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Fonte: ANP

Quando o PPI foi implementado em 2017, já vimos um aumento de diferentes players participando da importação de gasolina. Mas em 2021 e 2022, quando o reajuste de preços tornou-se menos frequente e os preços domésticos ficaram abaixo dos internacionais por um período mais longo, a participação da Petrobras voltou a crescer.

Preços da Gasolina Limitados são Negativos para o Etanol

Os consumidores escolhem entre gasolina e etanol com base na regra da relação de preços conhecida como paridade de preços do etanol da gasolina. Se estiver abaixo de 70%, os consumidores comprarão etanol em vez de gasolina.

O que isso implica é que, para manter uma relação favorável, toda vez que o preço da gasolina cair (seja por impostos mais baixos ou por preços mais baixos nas refinarias), o etanol também precisará cair para se manter competitivo.

Em um cenário em que os preços domésticos não acompanhem a referencia internacional, conforme proposto pelo novo governo, qualquer valorização do Brent não será refletida internamente e, conseqüentemente, os preços do etanol permanecerão limitados.

O governo decidiu acabar com a isenção de impostos federais para gasolina e etanol. E ao mesmo tempo parece que forçou uma decisão da Petrobras de reduzir o preço da gasolina em 4%.

O anuncio feito ontem a noite deixou muitas perguntas sobre qual exatamente são os novos valores de imposto, o Ministro da Fazenda pareceu esquecer sobre a Cide e disse que “ 0,47/litro para gasolina mas com a redução na refinaria então fica na verdade em BRL0,34/litro”. Seria esse o impacto final? A única coisa positiva foi a manutenção do diferencial tributário do etanol – garantido pela EC 123 de 2022.

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Qual o impacto para etanol? Pelo infográfico acima vemos que é positivo. Apenas a redução de preços da gasolina resultaria em um downside de BRL0,1/l. com a volta dos impostos, mesmo que parcial, resulta em quase BRL0,3/litro de potencial alta – dada a falta de claridade no anuncio, rodamos um cenário com a volta total da Cide em BRL0,1/litro.

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Resumindo

Ao criar mecanismos artificiais para manter os preços da gasolina baixos, o governo afasta o investimento privado na capacidade das refinarias, criando um potencial risco de abastecimento a longo prazo. Por quanto tempo a Petrobras aguenta ter prejuízo com importações?

Além disso, o papel crucial do etanol em manter o país abastecido precisa urgentemente de reconhecimento. Ao subsidiar a gasolina, reduz-se o potencial de preço do etanol. A capacidade de produção adicional é cada vez mais afastada – especialmente com o açúcar pagando ao produtor 38% a mais que o etanol.  

Ana Zancaner

Ana graduated from Insper University Sao Paulo in 2013, with a bachelor’s degree in business administration. She joined CZ as an intern in 2013 and is now our senior analyst in our Sao Paulo office. At CZ she is responsible mainly for analysis of the Brazilian sugar and ethanol sector but supporting other consulting requests as well.

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