Pontos Principais
- Economia deve crescer apenas 0,8% neste ano, diante de 3% em 2022
- Gastos do governo devem atingir R$ 100 bilhões a mais em comparação ao ano passado
- Desvalorização da moeda é inevitável?
Décima maior economia do mundo, o Brasil começou o ano com um cenário nebuloso no campo econômico. A previsão é de um crescimento tímido, de apenas 0,8% (diante de 3% no ano passado e 5% em 2021) e estimativas de inflação que não param de crescer. É verdade que essas previsões não são tão diferentes assim daquelas de outros países – os Estados Unidos podem até entrar em recessão neste ano e a Europa deve crescer apenas 0,7%. O Brasil, no entanto, tem um agravante. O país voltou a ser assombrado por um fantasma que pode afetar drasticamente a economia.
Diferentemente de outros países, o Brasil gasta, há muito tempo, mais do que arrecada. Na última década, as despesas do governo aumentaram 155%, passando de R$ 707 milhões em 2010 para R$ 1.800 milhões em 2022. A folha de pagamento de funcionários públicos representa cerca de 13,5% do PIB, o dobro (ou até mais) do que em países como o Chile (6,6% do PIB) e o México (5,3%). Para compensar o crescimento dos gastos públicos, o país historicamente aumentava a carga tributária.
Fonte: Tesouro Nacional
Nos últimos anos, começaram a ser feito esforços para mudar esse cenário e permitir um crescimento da economia mais sustentável. Em 2017, entrou em vigor o teto de gastos, que impedia o governo de gastar além do total do ano anterior (em valores corrigidos pela inflação). Também se optou por não aumentar a carga tributária e congelar os salários dos servidores públicos, que deixaram de receber aumentos. Com essas e outras medidas, o Brasil conseguiu obter um superávit primário (a diferença entre despesas e receitas do governo) positivo de R$ 54,1 bilhões, após oito anos consecutivos de um saldo negativo.
Agora, os gastos devem voltar a subir. O novo governo, que assumiu em 1º de janeiro, anunciou que não vai respeitar o teto de gastos. As despesas públicas devem chegar a pelo menos R$ 200 bilhões, o dobro de 2022. Não é de se admirar que o mercado tenha ficado espantado com a magnitude da ampliação das despesas. O governo precisaria arrecadar muito mais para arcar com os gastos, o que dificilmente vai acontecer. Com isso, desenha-se um quadro de desequilíbrio fiscal. E, nesse quesito, há ainda um outro agravante. É difícil estimar com precisão exatamente o quanto o governo vai gastar – pode ser mais do que R$ 200 bilhões, já que o valor final ainda não foi definido.
Fonte: BCB
O chamado risco fiscal, a percepção de que as contas do governo podem entrar em pane, voltou a frequentar as páginas da imprensa e das rodas de conversa de economistas e analistas de mercado. E por que isso é importante? Quando há um déficit nas contas públicas, fruto de um gasto maior do que a arrecadação, o governo precisa pegar mais dinheiro emprestado para pagar suas despesas. Da mesma forma como acontece como um indivíduo ou uma família, a dívida do governo aumenta. A União fica devendo mais dinheiro e, pior, é vista como um devedor pouco confiável, já que está gastando mais sem dizer como vai arcar com as despesas extras.
O governo pode emitir títulos para ajudar a financiar sua dívida. São os títulos do Tesouro Nacional. Desde o resultado das eleições presidenciais, no final de outubro, a taxa de juros desses títulos vem subindo. Isso significa que os investidores estão prevendo uma dificuldade maior do governo em honrar seus compromissos. Ao mesmo tempo, os economistas vêm revendo expectativas sobre a inflação e a taxa de juros básica da economia.
Quando o governo gasta mais, aumenta a demanda por produtos e serviços. Levando-se em conta que a oferta não cresce no mesmo ritmo, já que as empresas têm seu planejamento e em geral não fazem apostas de curto prazo, tudo fica mais caro. Em outras palavras, a inflação aumenta. É isso que os economistas preveem que deverá acontecer no Brasil.
Fonte: Banco Central
No dia 30 de janeiro, os especialistas que fazem parte do Comitê de Política Monetária, do Banco Central, previram uma inflação de 5,74% para este ano, a sétima alta semanal consecutiva. Na mesma semana, o Banco Central anunciou que deverá manter a taxa de juros em 13,75%, uma das mais altas do mundo, para conter os efeitos da inflação.
Taxas de Juros ao Redor do Mundo
Fonte: FMI
Há ainda um outro temor. Com o aumento do risco fiscal – e da insegurança em relação à condução da economia –, o dólar pode ser considerado um ativo mais seguro. A grande pergunta é quando e quanto o dólar poderá subir. Por enquanto, a cotação está ao redor de R$ 5. Os maiores bancos do país preveem que o câmbio deverá se situar em torno de R$ 5,35 até o final do ano. Mas não é uma opinião unânime.
“É razoável esperar o dólar a um nível próximo a R$ 6 e uma taxa de juros que deve superar os atuais 13,75% em função da deterioração do quadro macroeconômico”, analisa o economista Marcos Lisboa, fundador e presidente do Insper. “A falta de confiança na política monetária e fiscal está por trás da previsão para a economia brasileira”, diz Lisboa.
Fonte: BCB Sistemas de Expectativas
Gabriel Barros, sócio e economista-chefe da Ryo Asset, compartilha a mesma visão. “Com o governo insistindo na agenda fiscal frouxa e aumento da inflação, a dinâmica é de desvalorização do real mesmo. Deve chegar a R$ 5,5 em meados do ano”.
Caso essas previsões se confirmem, a inflação pode aumentar ainda mais, efeito bola de neve. O Brasil é dependente de importados, desde peças para maquinário até tratores usados na agricultura, e qualquer aumento do dólar gera um aumento de preços.