Pontos principais

  • O aumento da exportação brasileira de óleo de soja tem sido possível graças à redução no uso de biodiesel
  • Mistura obrigatória, que deveria ser de 14%, está em 10% devido a pressões econômicas e políticas
  • Não fosse o bom momento dos óleos vegetais, Brasil poderia enfrentar redução no esmagamento de soja

    

A disparada nas exportações de óleo de soja do Brasil nos últimos meses – resultado do aumento da demanda, da forte alta dos preços e da melhora das margens de esmagamento no país – tem levantado dúvidas sobre se o ritmo dos embarques será sustentável nos próximos meses. Outra pergunta frequente, especialmente entre estrangeiros, é sobre o impacto desse aumento das exportações de óleo de soja sobre o programa brasileiro de biodiesel.

De janeiro a abril, o Brasil exportou 709 mil toneladas de óleo de soja, segundo maior volume da série histórica, iniciada em 1997. Desse total, 507 mil toneladas tiveram a Índia como destino, contra 118 mil no mesmo período do ano passado. Maior importador mundial de óleos vegetais, a Índia tem aumentado suas compras no Brasil devido à menor disponibilidade de produto em outras origens, como a Indonésia (que impôs restrições à exportação de óleo de palma), a Ucrânia (que está impossibilitada de exportar óleo de girassol devido à guerra) e a Argentina (que exportou menos óleo de soja nos primeiros meses de 2022 devido à baixa disponibilidade de soja em sua entressafra e ao aumento do imposto de exportação do produto).

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Com demanda aquecida e preços firmes, a expectativa é de que o Brasil termine 2022 com exportação total de 1,8 milhão de toneladas de óleo de soja, de acordo com a Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais. Se confirmada, essa será a maior exportação do produto desde 2008, ano em que a mistura de biodiesel ao diesel fóssil se tornou obrigatória no país. E isso não é mera coincidência.

Interrupção de uma História de Sucesso

  
Iniciada em 2005, a mistura de biodiesel foi voluntária no Brasil até janeiro de 2008, quando a adição de 2% se tornou obrigatória. Desde então, o percentual subiu gradativamente até março de 2021, quando atingiu 13%. Mas a alta dos preços do óleo de soja, matéria-prima de aproximadamente 70% do biodiesel brasileiro, levou o governo a reduzir a mistura obrigatória para 10% em maio do ano passado. Em setembro, ela foi elevada para 12%, mas dois meses depois retornou a 10% e deve continuar neste patamar até o fim de 2022. A partir de março de 2023, em tese, a mistura deverá subir para 15%, conforme determina a lei original que regulamenta a mistura, mas ainda não se sabe se a redução do percentual será estendida.

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A redução da mistura obrigatória de biodiesel foi justificada pelo governo brasileiro como necessária para limitar a alta dos preços do diesel, que estariam sendo inflados pelo óleo de soja muito caro. Além do impacto na inflação causado pela grande dependência do transporte rodoviário que ainda existe no país, a alta dos preços do diesel também pesa na delicada relação entre o governo e os sindicatos de caminhoneiros, que acenam com a possibilidade de greve toda vez que veem seus ganhos diminuídos pelo combustível mais caro. Desde maio de 2018, quando uma greve dos caminhoneiros parou o Brasil por dez dias, uma paralisação do gênero se tornou, para o governo, um pesadelo a ser evitado a quase qualquer custo.

Além da questão econômica e política, a redução da mistura de biodiesel a partir de 2021 também contou com o apoio de entidades ligadas aos setores de combustíveis e automobilístico, que alertaram para eventuais danos que misturas superiores a 10% poderiam causar aos motores. As indústrias de óleos vegetais e os produtores de biodiesel reagiram, fazendo uma campanha de esclarecimento sobre “mitos” no setor do biodisel. O que acabou prevalecendo, porém, foram as forças a favor da manutenção da mistura em 10%.

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Ainda que a redução da mistura possa ter limitado a influência altista do óleo de soja sobre o diesel, ela não garantiu queda no preço do combustível, que segue impulsionado pela alta do petróleo . Levantamento da Agência Nacional do Petróleo (ANP) mostra que o preço médio do diesel nos postos do país subiram 70% entre janeiro de 2021 e março de 2022. No mesmo período, o preço FOB do óleo de soja exportado pelo porto de Paranaguá (PR) avançou 57%.

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Por conta da redução do percentual obrigatório, a produção de biodiesel fechou 2021 em 6,8 bilhões de litros – 400 milhões de litros acima de 2020, mas 1,2 bilhão de litros abaixo do que poderia ter sido produzido se a lei original houvesse sido cumprida e a mistura tivesse ficado em 13%. Para 2022, a expectativa é de nova redução, para cerca de 6,1 bilhões de litros.

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Exportação Aquecida Veio em Boa Hora

  
Caso a mistura adotada a partir de 2023 seja de 15%, conforme previsto originalmente, a demanda por biodiesel deve saltar para 9,4 bilhões de litros. Isso voltaria a limitar, novamente, as exportações brasileiras de óleo de soja, que estão aceleradas não apenas devido à demanda aquecida e aos preços altos, mas também porque a redução da mistura permitiu que o óleo de soja não usado pelas usinas de biodiesel fosse exportado.

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Sorte dos esmagadores brasileiros. Não fosse a oferta mundial apertada de óleos vegetais e a demanda extra pelo produto do Brasil agora em 2022, poderíamos enfrentar excesso de produção de óleo de soja em nosso mercado (considerando que o esmagamento continuaria firme para atender à demanda por farelo) ou, na pior das hipóteses, teríamos uma redução no esmagamento de soja.

Para os produtores de biodiesel, que já se sentem prejudicados pela mudança recente no modelo de comercialização (desde novembro de 2021, produtores e distribuidoras negociam os contratos entre eles, sem os leilões mediados pela ANP, e isso gera questões tributárias ainda não resolvidas), resta manter a esperança de que no futuro o governo intervirá menos no mercado, permitindo aos empresários planejar a expansão da produção sem grandes sustos.