Pontos principais

  • Rússia e Belarus foram origem de 47% do cloreto de potássio importado pelo Brasil em 2021
  • O Brasil tem negociado o aumento das importações de países alternativos, mas oferta é concentrada
  • A safra 2022/23 de soja deve ser plantada com menos fertilizantes, mas isso não significa necessariamente produtividade menor

     

Antes restrita a profissionais do agronegócio, que em 2021 já acompanhavam com atenção a forte alta nos preços dos fertilizantes, a preocupação com a dependência do Brasil em relação aos adubos importados virou mania nacional pouco depois que a Rússia invadiu a Ucrânia, em 24 de fevereiro.

Assim que a imprensa não especializada passou a dar manchetes revelando que 85% de todos os fertilizantes usados no Brasil são importados, e que Rússia e Belarus são origem de 28% dessas importações, o tema virou assunto na mesa do bar, na fila do supermercado, entre passageiros e motoristas de Uber.

E as principais perguntas, em geral, têm sido sempre as mesmas. Por que o Brasil importa tanto fertilizante e qual será o impacto na agricultura brasileira das sanções econômicas impostas à Rússia após a invasão da Ucrânia?

Potência do agronegócio, maior produtor e exportador mundial de soja, açúcar, café e suco de laranja, e dono de posições de destaque na produção e exportação global de milho, algodão e carnes, o Brasil também é gigante na importação de adubos para corrigir não apenas o solo pobre e ácido do Cerrado, onde ocorreu a maior parte da expansão da soja nas últimas décadas, mas também para melhorar a produtividade da agricultura de outras regiões do país que, ao contrário do senso-comum, não é uma terra em que se plantando tudo dá.

Em 2021 o Brasil importou 41,6 milhões de toneladas de fertilizantes, um novo recorde para o país, que se reveza com a Índia no posto de principal importador global. O estado que mais importou foi Mato Grosso (19%), maior produtor brasileiro de soja, milho e algodão, seguido por Rio Grande do Sul (16%) e Paraná (13%), que são grandes produtores de soja, milho e trigo.

Na safra 2020/21, antes do atual movimento de alta nos preços, o gasto com fertilizantes representou 34% do custo operacional de produção de soja em Sorriso (MT) e 14% em Londrina (PR), de acordo com a Conab. Na safra 2021/22, que está sendo colhida, a fatia dos fertilizantes subiu para 38% e 18%, respectivamente. Para 2022/23, os primeiros números do Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia Agrícola) mostram que o desembolso dos produtores do médio-norte do estado com fertilizantes deve dobrar em relação ao ano passado.

Para a soja brasileira, o principal problema é o cloreto de potássio, cuja demanda é 95% suprida por produto importado. Do total que vem de fora, quase metade (47%) tem Rússia e Bielorússia como origens. Para tentar contornar as dificuldades (ou até a completa impossibilidade) de comprar desses dois países, o governo brasileiro tem negociado o aumento das remessas para o Brasil com outros fornecedores, como Canadá e Israel.

Mas como o fornecimento de potássio é mais concentrado do que o dos fertilizantes fosfatados e nitrogenados, será muito difícil substituir todo o produto russo e bielorusso já para a safra 2022/23. Com o recém-lançado Plano Nacional de Fertilizantes traçado para aumentar a produção oméstica num horizonte de 50 anos, mas uma safra de soja que começa a ser plantada dentro de seis meses, a alternativa será usar menos adubo.

Por isso, e mesmo que os fertilizantes fiquem de fora das sanções impostas à Rússia, como pleiteia o governo brasileiro, a Embrapa deve começar em abril uma série de visitas às principais regiões agrícolas do país para treinar os produtores no uso mais eficiente de fertilizantes. A expectativa é reduzir o uso de adubos em 20% já na safra 2022/23, sem prejuízo significativo da produtividade, pois em muitos casos os produtores costumam usar mais fertilizantes do que é de fato necessário.

Estimativa da consultoria AgRural indica que aproximadamente 50% dos fertilizantes da safra 2022/23 de soja já foram comprados antecipadamente pelos produtores, especialmente no Centro-Oeste e Norte/Nordeste. Há dúvidas, porém, quanto à entrega por parte de russos e bielorrussos. Dificuldades logísticas resultantes de compras feitas muito em cima da hora em países alternativos também podem ser um problema.

Essas incertezas, aliadas ao forte aumento dos preços, poderão limitar o crescimento da área de soja na nova safra, que tende a ser inferior aos 3,5% da safra 2021/22. Até o momento, porém, não se fala em redução da extensão cultivada. A AgRural deve divulgar sua primeira estimativa de área plantada com soja na safra 2022/23 do Brasil em julho. A última vez que o país reduziu a área plantada com soja foi na já longínqua safra 2006/07.