Pontos Principais
A União Europeia anunciou que vai adiar a implementação da lei antidesmatamento. Isto aconteceu após protestos de parceiros comerciais e defensores da agricultura. O regulamento proíbe a importação de alimentos de países com risco de desmatamento.
Lei Antidesmatamento é Adiada para 2025.
Depois de uma série de discussões com países como o Brasil, principal fornecedor de commodities agrícolas para a Europa, e representantes da cadeia global do comércio de alimentos, os reguladores europeus decidiram adiar a implementação da lei antidesmatamento em um ano.
Fonte: Comissão Europeia.
A nova data para a norma entrar em vigor é dezembro de 2025. A lei proíbe a importação de alimentos de países com áreas desmatadas, incluindo a soja, carne, óleo de palma, madeira, cacau e borracha.
A decisão não chegou a pegar de surpresa profissionais de comércio internacional e representantes do governo, que vinham revelando preocupação com a falta de clareza sobre alguns pontos da lei.
Para entender melhor esse assunto, entrevistamos o advogado Rodrigo Lima, sócio da Agroícone, especializado em relações internacionais e sustentabilidade no agronegócio.
Rodrigo Lima. Foto: divulgação.
O que levou ao adiamento da entrega em vigor da lei antidesmatamento da Europa?
Um dos principais motivos foi a falta de detalhes sobre uma série de pontos importantes. Será necessário, por exemplo, fornecer várias informações sobre a área de produção do alimento, mas ainda não se sabe exatamente quais documentos e certificações serão solicitados. Considerou-se que o adiamento da implementação da lei vai ser importante para definir essas questões.
Há também uma discussão de que a lei europeia se sobrepõe à legislação dos países exportadores, não?
Sim. No caso do Brasil, a lei permite a supressão de vegetação dentro de determinados limites e regras. O Código Florestal obriga a preservação de mata nativa nos imóveis rurais. A norma europeia cria regras extraterritoriais, definindo obrigações em outros países, o que é visto como algo complexo. E ônus ficará para o importador, que vai precisar gerenciar, por exemplo, o nível de risco da área produtiva. De qualquer forma, temos a obrigação de combater o desmatamento ilegal e preservar o meio ambiente.
O importador também precisaria arcar com custos maiores e eventuais penalidades?
Exatamente. A lei prevê que o importador precisa apresentar informações até sobre a complexidade da cadeia de produção do alimento. Isso não é algo trivial e tudo isso gera custos, o que pode impactar o preço final dos alimentos. No caso do descumprimento das exigências, haveria multas. E não ficou claro exatamente que tipo de documentos e diligências serão pedidos.
Também serão definidas áreas de risco, em que a produção agrícola estaria mais sujeita a problemas ambientais?
Sim, mas falta definir melhor os critérios. Entendemos que locais com maior desmatamento ou população indígena podem ter um risco maior, mas é preciso especificar tudo o que vai interferir nessa classificação.
De qualquer forma, o importador pode simplesmente decidir não comercializar produtos de áreas de risco. Com isso, vários produtores que fazem tudo certo podem ser excluídos, inclusive os pequenos agricultores. Então, a lei pode acabar provocando uma exclusão e não ter muito impacto em resolver a questão do desmatamento.
A lei pode não ser efetiva para ajudar a resolver o problema do desmatamento?
A intenção é reduzir o desmatamento no mundo, mas há dúvidas se a norma, do jeito que ela foi feita, poderá ajudar mesmo. Além disso, uma das principais preocupações é com os pequenos produtores, que talvez não tenham condições de arcar com os gastos para obter certificações. E existem muitos pequenos proprietários de terras no Brasil*.
(*nota da redação: imóveis rurais de até 10 hectares são considerados de pequeno porte).
Fonte: IBGE.
Qual seria uma maneira mais efetiva de ajudar a reduzir o desmatamento? Uma das maneiras seria ajudar os agricultores familiares a se cadastrar no CAR (Cadastro Ambiental Rural), cujo prazo de inscrição foi estendido até dezembro de 2025 para os pequenos agricultores. O CAR é um instrumento do governo para mapear áreas degradadas e preservadas no campo, o que ajuda a planejar a conservação ambiental.
Gostaria de reforçar que o objetivo da lei europeia, de acabar com o desmatamento, está correto. Mas dá a impressão de que essa meta pode não ser atingida e, além disso, falta definir vários pontos da lei.
Finalizando, o que precisa ficar mais claro na lei?
Precisa definir melhor que tipo de documento e certificação serão necessárias para as diligências que precisarão ser feitas, quais critérios serão utilizados para definir as áreas de risco e o que precisará ser feito para gerir o risco. É isso que se espera fazer em um ano, até o final do ano que vem.