Pontos principais

  • Puxada pela demanda da União Europeia, a exportação de farelo cresceu 40% no primeiro trimestre.
  • Os embarques de óleo mais do que dobraram no mesmo período, alavancados por compras da Índia.
  • O avanço é explicado pela melhora nas margens de esmagamento, e não por mudanças estruturais.

 

Apesar da quebra da safra 2021/22 de soja por seca (o Brasil está terminando de colher uma produção de aproximadamente 122 milhões de toneladas, contra expectativa inicial de 145 milhões), as exportações de farelo e óleo de soja atingiram marcas históricas no primeiro trimestre de 2022, estimuladas pelo aumento da demanda e pela alta dos preços, que reforçaram as margens de esmagamento brasileiras.

Os embarques de farelo somaram 4,5 milhões de toneladas, 40% acima da exportação feita no mesmo período de 2021 e maior volume para o período desde 1997, início da série histórica da Secretaria de Comércio Exterior. A União Europeia, tradicionalmente o maior comprador brasileiro de farelo, levou 2,2 milhões de toneladas (aumento anual de 32%), seguida por Indonésia (752 mil toneladas, +16%) e Tailândia (619 mil toneladas, +47%).

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A exportação de óleo de soja, por sua vez, mais do que dobrou no primeiro trimestre de 2022, somando 478 mil toneladas, a mais alta desde 2008. Desse total, a Índia importou 348 mil toneladas, contra 78 mil no mesmo período de 2021, num salto explicado pelo controle das exportações de óleo de palma imposto pela Indonésia, pela redução das exportações da Argentina e pelo receio de novos aumentos nos preços internacionais dos óleos vegetais, que já vinham embalados desde o ano passado e, recentemente, receberam oreforço da guerra na Ucrânia, maior exportador mundial de óleo de girassol.

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Soja em grãos também faz novo recorde

Estaria o Brasil, finalmente, alterando seu perfil exportador e apostando mais fichas na venda dos subprodutos, que têm maior valor agregado? Não exatamente. As exportações de soja em grãos cresceram de janeiro a março, chegando a 21 milhões de toneladas, 36% acima dos 15,4 milhões de toneladas do primeiro trimestre de 2021 e também estabelecendo novo recorde para o período.  

Mas a expectativa é de que os embarques do grão percam força a partir de abril, pressionados pela produção menor, pelo mercado doméstico mais agressivo e pela demanda chinesa mais fraca. Por conta desses fatores, a expectativa da consultoria AgRural (e também da Conab) é de que o Brasil exporte apenas 77 milhões de toneladas de soja em grãos em 2022, ante recordede 86,1 milhões de toneladas em 2021.

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A Abiove, Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais, também estima queda na exportação de soja em grãos em 2022, para 77,7 milhões de toneladas, mas vê espaço para aumento dos embarques de farelo, que atingiriam recorde de 18,3 milhões de toneladas (6% acima do ano passado), e para um ligeiro incremento na exportação de óleo de soja, que passaria de 1,651 milhão de toneladas em 2021 para 1,700 milhão em 2022. Nos dois casos, o aumento aconteceria à custa de uma redução no consumo interno.

Menos biodiesel

Embora a queda na demanda doméstica por farelo em 2022 seja polêmica (ela não tem a chancela nem da Conab, nem do USDA), o recuo no consumo interno de óleo de soja já está estabelecido desde 2021, quando o governo federal reduziu a mistura obrigatória de biodiesel de 13% para 10%, na tentativa de minimizar o impacto da alta dos óleos vegetais nos preços do diesel, no frete rodoviário e na inflação. 

Essa medida não levou a uma queda na produção de óleo de soja, e sim a um remanejamento da demanda, com migração para a exportação do volume não usado na produção de biodiesel. Agora em 2022, quando a mistura de 14% deveria estar em vigor, o diesel segue recebendo adição de apenas 10%, reforçando as exportações brasileiras de óleo de soja.
 

Sem aumento na capacidade instalada

Entre 2015 e 2020, a produção e a exportação de soja em grãos subiram 43% e 59% no Brasil, respectivamente. O esmagamento, por sua vez, cresceu 16%, passando de 40,6 milhões para 46,8 milhões de toneladas. A capacidade instalada de processamento, porém, praticamente não mudou: passou de 170,4 mil toneladas/dia para 171 mil toneladas/dia, segundo a Abiove.

O avanço do esmagamento acontece sem aumento da capacidade instalada porque a indústria brasileira, de um modo geral, trabalha com capacidade ociosa significativa, aumentando a produção quando as condições de mercado favorecem o esmagamento para o mercado interno e especialmente para exportação de óleo e farelo, como é o caso agora em 2022.

No começo de março, a margem de processamento calculada com base nos preços do porto de Paranaguá (PR) atingiu US$ 122 por tonelada de soja no mercado disponível, de acordo com monitoramento da AgRural. Agora em abril, a margem spot está em torno de US$ 60 por tonelada e recua na curva futura até agosto, mas segue positiva, favorecendo a indústria.

Mas um estímulo maior ao esmagamento só deve acontecer quando (e se) houver uma mudança no perfil importador da China (que prefere importar soja em grãos) e uma revisão de algumas questões tributárias que penalizam a produção doméstica de óleo de farelo. É o caso, especialmente, da Lei Kandir, que desde 1996 desonera a exportação de soja em grãos, mas obriga a indústria esmagadora a pagar ICMS sobre a soja comprada de outros estados. Quando o farelo e o óleo produzidos com essa soja são destinados à exportação, a indústria recebe o imposto de volta, em forma de créditos tributários, mas o processo é lento e burocrático.