Pontos Principais
Governo deve leiloar 24 rodovias até 2025 e prepara um pacote de concessões de ferrovias com foco no Centro-Oeste e Norte, no centro da produção agrícola. Projetos são importantes para o escoamento de grãos e outras commodities.
Governo lança leilões para estradas e prepara plano de ferrovias
Não é de hoje que os gargalos de infraestrutura representam um dos maiores desafios para o escoamento da produção agrícola no Brasil. Com apenas 13% das estradas pavimentadas e 31 mil quilômetros de ferrovias, sendo que 10 mil quilômetros estão inoperantes, as dificuldades logísticas não são poucas. Para efeito de comparação, a malha ferroviária americana é de 225 mil quilômetros.
A boa notícia é que nos últimos anos foram realizadas uma série de concessões de rodovias e ferrovias para aprimorar a infraestrutura de transportes. Agora, o governo se prepara para leiloar 24 estradas e, se tudo der certo, algumas ferrovias. “Temos um grande desafio”, diz George Santoro, secretário executivo do Ministérios dos Transportes, em entrevista exclusiva ao CZ App.
George Santoro, secretário executivo do Ministério dos Transportes. Fonte: Marcio Ferreira/Ministério dos Transportes.
Como está o plano de realização de leilões de rodovias? Serão 12 leilões mesmo neste ano?
Sim. Já temos dois importantes leilões marcados, da BR 181, no trecho de Minas Gerais, e da BR 040, entre Belo Horizonte (MG) e Cristalina (GO). Outros três já foram aprovados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), como a BR 153/262 e a BR 262, em Minas. A concessão da CN2, de Goiás, também deve sair. E vamos fazer concessões de rodovias estaduais que foram federalizadas em Goiás, na rota do agronegócio. Esses são alguns exemplos.
Essas estradas de Goiás são importantes para o escoamento de grãos, não?
Sim. Os leilões de rodovias estão muito focados em estradas do Centro-Oeste e Minas Gerais. Tem uma também em Rondônia, a BR 364, no Arco Norte, entre Porto Velho e Vilhena. O volume de grãos escoados por essas rodovias tem aumentado muito, então essas concessões são fundamentais. A ideia é reduzir o custo logístico, com melhorias na pavimentação, duplicação de pistas e uma maior segurança viária.
Fonte: CNT.
Alguns contratos de concessão antigos, que tiveram problemas, devem ser revistos?
Sim, há uma agenda de otimização de alguns contratos. São contratos antigos que, por erros de demanda e mudanças de logística de transportes de carga, precisam ser refeitos. Então, remodelamos os contratos, que agora vão a leilão.
E qual é o plano de concessões para o ano que vem?
Vamos leiloar mais 12 rodovias. Todos os editais e contratos serão padronizados. O que muda é a modelagem econômica de cada projeto, mas o padrão técnico é o mesmo. Estamos fazendo isso para reduzir o prazo de colocar os projetos na praça e atrair investimentos. Hoje, levamos cerca de três anos para concluir um projeto, o que já representa um avanço. Mas o ideal é um ano e meio ou dois. Estamos buscando isso.
Fonte: Inter.B.
Investidores
Como está o interesse dos investidores pelos leilões que serão realizados neste ano? Há interesse da China, por exemplo?
A China está com um grande projeto na Bahia, da ponte Salvador-Itaparica. E a empresa de engenharia Concremat agora é chinesa. A China está muito interessada em segurança alimentar. As conversas com as empresas chinesas são muito nesse sentido. Mas a China ainda está namorando o nosso mercado de infraestrutura. É mais provável que em 2025 alguma empresa chinesa entre em algum leilão.
Fonte: BRICs e Conselho Empresarial Brasil China.
Neste ano, os players mais conhecidos do mercado é que devem participar dos leilões?
Sim, são grandes empresas que já conhecem o nosso mercado. As empresas europeias, por exemplo, têm mais tradição de participar dos nossos leilões. Importante dizer que se somarmos a remodelagem de contratos antigos e os novos leilões que faremos neste ano, dá R$ 200 bilhões de investimento. Bancos e fundos de investimento estão conversando para formar consórcios e participar dos leilões. E haverá uma linha de crédito do BNDES para esses leilões, o que deverá ajudar a atrair investidores.
O risco fiscal, com aumento dos gastos públicos e oscilações do câmbio, pode prejudicar os leilões?
Quem olha para projetos de infraestrutura de longo prazo não está muito preocupado com isso. Mas em relação a fundos de investimento que pretendem ter um retorno mais rápido, digamos de quatro anos, é necessária uma certa estabilidade. E as construtoras não querem se expor ao risco, o que dificulta. Elas precisam ter estrutura de capital e os fundos acabam fazendo uma composição interessante porque captam dinheiro mais barato. Isso abre o mercado.
Fonte: Banco Central.
Como o agronegócio está vendo esses projetos?
São projetos muito importantes para o setor. O agronegócio está tenso porque muitas vezes a carga fica parada. E a tendência é que o mundo demande dezenas de milhões de toneladas de grãos a mais por ano, com o Brasil exercendo um papel importante nesse cenário. E aqui há ainda o problema de concorrência nos portos entre grãos e açúcar. O nosso desafio logístico é gigantesco.
Fonte: FAO.
Não é importante olhar também para as estradas vicinais, que transportam a carga até as estradas principais?
Sim. Fechamos uma parceria com o Banco Mundial para estruturar um modelo de concessão dessas rodovias, que são muito importantes para o agronegócio. Em alguns casos, faremos parcerias público-privadas. O Banco Mundial já concluiu os estudos e a modelagem das concessões deve fechar em julho, para serem lançadas até o final do ano.
Ferrovias
Em relação às ferrovias, como estão os projetos?
Devemos lançar um plano neste ano. É preciso lembrar que alguns contratos com operadores de ferrovias estão vencendo e algumas renovações foram antecipadas nos últimos anos. Nós entendemos que a precificação estava inadequada em alguns casos. Foi feita uma renegociação com operadores como a Rumo e MRV. Com a Vale, estamos finalizando a renegociação. Isso vai gerar recursos que podem chegar a R$ 25 bilhões.
Queremos que esses recursos fiquem na nossa pasta, e não no Tesouro Nacional, para financiar um grande plano de ferrovias. Os grandes projetos de ferrovias no mundo contam com dinheiro público. Mas claro que tudo isso vai depender de aprovação do governo. No caso das ferrovias, o objetivo é que o governo invista uma parte e a iniciativa privada entre com o restante.
Fonte: Inter.B.
E como estão os projetos da Ferrovia de Integração Centro-Oeste, a Fico, e outras ferrovias?
O primeiro trecho da Fico, entre Goiás e o Mato Grosso, deve ser entregue pela Vale até 2027. No trecho 2, no centro do agronegócio, entre as cidades de Água Boa e Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, a ideia é fazer uma concessão.
No caso da Ferrovia de Integração Leste-Oeste, a Fiol, temos um problema porque o trecho 1, de mais de 400 quilômetros, está sob responsabilidade de uma empresa que recentemente teve os seus bens confiscados e mandou mais de 500 trabalhadores embora. Como o mercado tem revelado interesse pela empresa, talvez essa questão seja solucionada pelo próprio mercado.
Sei que a questão dos portos não é da sua alçada, já que o senhor responde por transportes terrestres, mas aí também temos um problema, não?
Sim. Não é o porto mais eficiente que é escolhido para escoar a carga, mas sim aquele que representa o menor custo para a mercadoria chegar até ele. Isso acontece porque não há conexão entre os modais de transporte. Também precisamos de ferrovias mais eficientes. No pacote de ferrovias que devemos lançar, deverá haver algumas figuras regulatórias que vão aumentar a capacidade da malha ferroviária.
Trem da Rumo. Fonte: Rumo.
Em geral, as ferrovias no Brasil são operadas pelas empresas que são donas da carga. Uma das medidas que estamos propondo se refere ao índice de saturação da malha. Hoje, não pode ultrapassar 90% da capacidade de operação em nenhum momento do ano. Vamos mudar isso. Será mantido o teto de 90%, mas será criada uma média móvel.
A ideia é copiar o modelo de slots do setor aéreo. Com isso, a ferrovia terá mais interesse em abrir espaço para a carga de terceiros. Já estamos conversando com as empresas que operam as ferrovias, mas não é assim tão tranquilo porque vamos estimular a concorrência entre os diferentes operadores da malha. E isso não é rápido, precisa colocar em consulta pública e ouvir o setor.
Ao mesmo tempo, projetos de ferrovias como a Ferrogrão estão parados, não?
Não dá para dizer que está parado. Em abril, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu para endereçarmos a questão ambiental da Ferrogrão, que passa por um parque nacional. O STF nos autorizou a atualizar os estudos, que já foram entregues (nota da redação: o projeto da ferrovia foi suspenso pelo STF devido a questões ambientais e a lei que permitia sua criação foi considerada inconstitucional; o processo poderá ser julgado novamente no segundo semestre). Nossa ideia é realizar o leilão.
Não é arriscado realizar o leilão sem a licença ambiental?
Estamos assumindo que o governo vai entrar com recursos e que haverá a licença ambiental. A empresa que assumir a concessão não terá obrigação nenhuma antes da licença se concretizar. Estamos discutindo esse modelo.
Mesmo sem a licença ambiental, o projeto teria empresas interessadas?
Sim, porque o governo seria sócio do projeto. Há dois modelos. Um deles é esperar a licenciamento ambiental, o que levaria de dois a três anos. A outra ideia é criar condições legais e contratuais para mitigar os riscos, com o governo como sócio do projeto.
Instituições como o Banco Mundial podem participar da modelagem do projeto?
É difícil porque o Banco Mundial tem um compliance forte em relação à questão ambiental. Temos que trabalhar com o agronegócio e fundos de investimento. O próximo passo é elaborar uma estratégia. Estou otimista.