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Em meio às enchentes no Sul, cresce o sentimento de incerteza sobre as contas públicas, com impacto sobre a cotação do dólar e outros indicadores. A saída de Roberto Campos da presidência do Banco Central também está no radar.

Aumento do dólar e incerteza fiscal preocupam

Poucas vezes a questão dos gastos públicos e dos rumos da economia esteve tão evidente no Brasil. Em meio às enchentes no Rio Grande do Sul, com perdas que passam de R$ 1,3 bilhão só no agronegócio, os economistas revelam um sentimento de incerteza em relação aos gastos públicos e à condução da política econômica brasileira.

Fatores como a piora da percepção do risco fiscal, com a dificuldade em reduzir o déficit público, e a despedida de Roberto Campos Neto do Banco Central, em dezembro, estão no radar do mercado.

O impacto sobre a cotação do dólar é dos sinais mais visíveis desse cenário. Em abril, o câmbio desvalorizou 3,5%, fechando a R$ 5,19.

Pode até não parecer muito, mas na percepção dos economistas trata-se de algo que sinaliza uma questão mais complexa. Conversamos com Gabriel Barros, economista-chefe da Ryo Asset e ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), sobre o tema. Veja a entrevista a seguir.

Gabriel Barros, economista-chefe da Ryo Asset. Fonte: divulgação/Gabriel Barros.

Como você vê o sentimento no Brasil em relação à economia e ao câmbio?

Temos que pensar sobre os motivos por trás do aumento do dólar. Não é tão significativo, neste momento, o quanto o dólar aumentou, mas sim o porquê. É algo qualitativo. A percepção é de que houve uma piora do quadro fiscal, ou seja, da capacidade do país em controlar seus gastos e receitas, entre outras coisas. Há também um sentimento de que a mudança de comando no Banco Central, em dezembro, deve provocar mudanças na política fiscal e econômica brasileira.

gráfico da evolução da dívida líquida do setor público Economia Brasileira

Fonte: Banco Central

Qual é a percepção do mercado sobre a troca de comando no Banco Central?

Roberto Campos Neto deixa a instituição em dezembro, como estava previsto. No lugar dele, deve entrar um economista mais heterodoxo, alinhado com a visão do governo.

Um dos economistas mais cotados para substituir Roberto Campos na presidência do Banco Central é Gabriel Galípolo, que atuou como secretário executivo no Ministério da Fazenda do atual governo e hoje integra a diretoria do Banco Central.

A expectativa é de que a agenda política pode interferir na condução do Banco Central, já que Galípolo é próximo ao governo, o que tem gerado ruídos.

E isso já estaria provocando preocupações em relação a investimentos e à economia brasileira?

Sim. Na minha visão, a alta do dólar se deve principalmente a esse motivo. É importante dizer que mesmo que seja indicado outro economista para a presidência do Banco Central, o sentimento é de que provavelmente será alguém alinhado com o governo.

A visão do governo é que o Estado deve conduzir o desenvolvimento econômico. Do ponto de vista prático, isso pode significar, por exemplo, baixar a taxa de juros com o objetivo de facilitar o consumo e a tomada de crédito mesmo que a inflação não tenha diminuído.

Evolução da taxa de juros no brasil Economia Brasileira

Fonte: Banco Central.

É isso que o mercado teme?

Exatamente. Esse temor começou a crescer à medida que foram circulando os nomes cotados para presidir o Banco Central e, ao mesmo tempo, foi sendo observado um aumento dos gastos públicos. É um conjunto de fatores, com alguns mais preponderantes.

O cenário externo também interfere nessa percepção?

Sim. Não podemos esquecer que dificilmente os Estados Unidos baixarão a taxa de juros no curto prazo e o investidor brasileiro deve olhar com cada vez mais interesse o mercado americano.

Os Estados Unidos são considerados confiáveis e o dólar é visto como um investimento seguro. A favor do Brasil, temos a percepção de que foi reduzido o número de países emergentes que atraem investimento internacional, com a Rússia de fora e outros países apresentando ruídos políticos e econômicos, como a Turquia.

Qual é o sentimento do mercado sobre o futuro da economia brasileira?

Caso a visão que apresentei se confirme, podemos esperar consequências para o câmbio, com o dólar mais alto e uma saída maior de capitais para outros países.

Se a taxa de juros cair sem acompanhar a queda da inflação, pode haver também um aumento dos preços.

Agora há também a questão das enchentes no Rio Grande do Sul, que demandam uma ajuda financeira emergencial. O que nos ajuda é que somos um grande exportador de commodities, algo benéfico para a balança comercial.

saldo da balança comercial brasileira Economia Brasileira

Fonte: Banco Central.

O que poderia ser feito para mudar a percepção sobre os rumos da economia?

Na minha visão, deveria ser feita uma revisão de gastos e um esforço para reduzir o déficit fiscal, que é historicamente alto no Brasil.

Mesmo em comparação a outros países emergentes, nossos gastos públicos são altos. Nossa carga tributária também é alta, então precisariam ser feitas uma série de revisões para o país começar a crescer de forma sustentável.

Fonte: Banco Central.

Carla Aranha

Carla joined Czarnikow in 2022 having previously worked at Exame and Valor, leading economic media outlets in Brazil, where she developed projects and news coverage focusing on the agribusiness and commodities markets. Carla is responsible for writing content, providing interesting article´s subjects and reports as well as producing press releases together with the marketing team.

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