Pontos Principais

  • Nordeste responde por quase 83% da capacidade de geração de energias renováveis no Brasil.
  • Porto de Suape lança hub de inovação em parceria com a iniciativa privada.
  • Produção em larga escala, no entanto, deve acontecer no longo prazo.

Responsável por 81,8% da capacidade instalada de geração de energia solar e eólica no Brasil, com 27,8 gigawatts (GW), o Nordeste deve continuar se destacando no mercado de fontes renováveis e transição energética. Não é de se admirar que a região esteja atraindo interesse também para a produção de hidrogênio verde, obtido a partir da eletrólise da água realizada com fontes renováveis.

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Fonte: ONS

Portos como o de Suape, em Pernambuco, e Pecém, no Ceará, estão se movimentando para captar recursos e estruturar projetos de produção de hidrogênio, visando o mercado doméstico e as exportações.

Empresas de países como a Austrália, Holanda e França anunciaram investimentos de US$ 21 bilhões no desenvolvimento de usinas de hidrogênio verde no porto de Pecém. O porto de Suape, que reúne 82 empresas de setores como graneis líquidos e gases, energia, petroquímico, alimentos e bebidas e farmacêutico, está desenvolvendo um hub de inovação de hidrogênio verde em conjunto com o Senai e a iniciativa privada. A intenção éimp lementar tecnologias para reduzir custos de fabricação de equipamentos como eletrolisadores, além de criar soluções para armazenagem.

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Fonte: Antaq

“Pode ser que a gente esteja diante de uma grande oportunidade de conseguir colocar o nosso país em outro patamar devido às energias renováveis, entre elas o hidrogênio”, diz Marcio Guiot, diretor-presidente do porto de Suape, em entrevista exclusiva para o Czapp. Leia os principais trechos a seguir.

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Marcio Guiot, diretor-presidente do porto de Suape. Foto divulgação.

Qual deverá ser a importância do hidrogênio verde para a transição energética?

Há uma expectativa muito grande, principalmente por parte da Europa, mas ainda há perguntas a serem respondidas. Estive no Reino Unido recentemente, a convite do governo britânico, junto com representantes de outros portos brasileiros. Tivemos a oportunidade de visitar o porto de Aberdeen, na Escócia, que tem um plano avançado de importação de hidrogênio verde. Mas ainda tem muita coisa sendo estudada, inclusive em relação a diferentes tipos de eletrolisadores e formas para tornar cada vez mais barato o processo de produção. Também há muitos projetos de pesquisa e desenvolvimento.

Vocês conversaram sobre parcerias durante essa visita?

Faz parte do nosso plano estratégico estruturar parcerias. Conhecemos muito players durante essa viagem, mas não chegamos a firmar parcerias. Serviu para trocarmos experiência. O Reino Unido está avançando e deverá usar hidrogênio verde no transporte público, por exemplo, embora ainda em pequena escala. Mas o custo ainda é muito alto.

Regulamentação é outro tema importante, não?

Sim. A questão de políticas públicas faz parte desse tema, incluindo normas técnicas de segurança, de como manusear e armazenar o produto. Ainda há um ponto de interrogação sobre como o hidrogênio vai ser exportado. Como ele será transportado, por exemplo de Suape para a Europa? Hoje, o que se fala é em amônia. Precisa converter o hidrogênio em amônia. E há uma perda nesse processo. Quando se fala em grande escala, todas essas questões de distribuição estão sendo vistas. De qualquer forma, é um tema muito quente e estamos muito atentos e interessados, embora com cautela.

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Porto de Suape. Foto divulgação.

Quando o transporte de hidrogênio deve acontecer em grande escala?

Provavelmente, daqui a oito ou dez anos. Mas o nosso planejamento está seguindo forte, para aproveitar essas oportunidades. O porto de Suape deve crescer cinco vezes em tamanho nos próximos anos e parte desse potencial pode ser direcionado ao hidrogênio verde. Temos também o hidrogênio azul e outras formas de energia renovável que serão igualmente exploradas.

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Fonte: Antaq

Há questões relacionadas à tecnologia, inclusive para baratear custos, que também precisam evoluir?

Sim. O transporte também é um desafio. Já há navios fabricados recentemente que são híbridos, que podem operar com gás natural liquefeito (GNL). A maioria, no entanto, continua a operar como bunker poque não há fornecimento de gás nos diversos portos em que esses navios atracam. Com o hidrogênio, também há pontos que vão precisar ser endereçados. De qualquer forma, temos a expectativa de exportar hidrogênio verde. O Brasil é para energia renovável o que os Emirados Árabes são para o petróleo. Somos a meca da energia renovável por causa do custo. O nosso hidrogênio provavelmente vai ser bem mais barato do que o de fora.

Por quê?

Para fazer a eletrólise da água e produzir hidrogênio, é necessária uma matriz limpa. Hoje, a nossa matriz já é limpa. Não há necessidade de fazer grandes investimentos, diferentemente do que acontece, por exemplo, em países mais desenvolvidos.

Ao mesmo tempo, países como os Estados Unidos estão implementando subsídios para a fabricação de hidrogênio verde. Como você vê essas discussões no Brasil?

Eu diria que no início é fundamental ter algum tipo de incentivo para o mercado se desenvolver. Talvez no Brasil o subsídio seja menor, até porque já temos uma condição privilegiada. Temos um potencial onshore muito grande no Nordeste, por exemplo, com energia eólica. E o custo do onshore é muito menor do que o offshore, como é estudado em alguns países. Aqui em Pernambuco, temos sol o ano todo. Imagina encher o sertão de painéis solares. O que olhamos aqui também é o potencial de usar as energias renováveis para atrair a indústria. No Brasil, pode ser que a gente esteja diante de uma grande oportunidade de conseguir colocar o país em outro patamar devido às energias renováveis.

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Fonte: ONS

Como o Brasil está competindo com outros países na produção e exportação de hidrogênio verde, precisamos assumir um certo protagonismo nessa questão, não?

Eu sempre digo que tem sol e vento em qualquer lugar, em menor ou maior escala. A diferença é o quanto se paga para produzir energia renovável. O custo de produção é o grande pulo do gato para o Brasil se tornar uma das mecas da energia renovável. A ideia é que o hidrogênio chegue na Europa a preços mais em conta do que aquele que será produzido no próprio continente europeu. Mas isso depende de incentivos e outras questões. Na Europa, a segurança energética virou uma questão estratégica desde a guerra na Ucrânia, então provavelmente os países europeus vão investir em políticas públicas e subsídios para conseguir gerar mais energia.

É importante também reduzir custos do armazenamento nos portos, não?

Sim. Tem muita coisa sendo estudada. Esse é um dos motivos pelos quais estamos no TechHUB, que é um centro de inovação voltado ao hidrogênio verde. Hoje, a discussão em torno do hidrogênio está mais concentrada no meio acadêmico. Por isso, vamos ter projetos aqui no porto, junto ao Senai e à iniciativa privada, de estocagem e produção.

Você pode falar mais sobre esses projetos?

Serão vários tipos de projetos, conduzidos aqui no porto, explorando toda a cadeia. Vamos interagir com as indústrias já estabelecidas em Suape, para saber como eles pretendem utilizar o hidrogênio e tentar ajudar por meio da estrutura do centro de inovação que estamos montando. O objetivo é atender o complexo de empresas do porto, em um primeiro momento. É importante lembrar que o hidrogênio verde está inserido em um contexto de descarbonização, então teremos projetos de energia renovável em geral.

O Brasil precisa ser mais propositivo na produção de hidrogênio de baixo carbono?

A questão inicial é como aplicar o hidrogênio nas diversas cadeias produtivas. É isso que estamos vendo no porto neste momento. A ideia é como abastecer as indústrias já instaladas aqui e como colaborar para que o país seja carbono neutro. A Europa vai adotar uma nova legislação que vai penalizar a importação de alimentos produzidos em desacordo com normas ESG e desmatamento. Vai ser importante o Brasil conseguir se colocar como um país de produção carbono neutro. Aí, os produtos brasileiros poderiam chegar de uma forma mais competitiva ao seu destino, seja a Europa, Estados Unidos ou Ásia. O horizonte para o Brasil no tema da descarbonização é fantástico. Por isso, eu torço, como brasileiro, para que de fato o país consiga capturar isso da melhor forma possível.

Carla Aranha

Carla joined CZ in 2022 having previously worked at Exame and Valor, leading economic media outlets in Brazil, where she developed projects and news coverage focusing on the agribusiness and commodities markets. Carla is responsible for writing content, providing interesting article´s subjects and reports as well as producing press releases together with the marketing team.

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